A categorização do acesso à Internet e o fim da Norma 4

Por Fabio Vianna Coelho (*)

O Tribunal de Justiça do Maranhão anulou, no final de agosto, a aplicação de multas que somavam R$ 4,4 milhões a quatro provedores de Internet por conta do não recolhimento de ICMS resultante da atribuição de serviço de telecomunicações como SVA.

Apesar da decisão judicial, praticamente todos os ISPs maranhenses teriam recebido, em abril, sanções da mesma natureza por parte da secretaria da Fazenda, conforme informou o portal Teletime. Interpretações divergentes como as citadas acima, que ocorrem em todo o país há anos, resultam da sobreposição das regras que definem a natureza do provimento de acesso à web, algo que poderá ter fim em 2027, se a Norma 4/95, do Ministério das Comunicações, for, de fato, extinta, como anunciado pela Anatel.

O alcance das autuações do fisco maranhense leva a crer que é prática generalizada entre os provedores do estado declarar sua principal oferta como Serviço de Conexão à Internet (SCI), definido pela Norma 4 como um SVA, categoria que, diferentemente do SCM, é isenta de ICMS e das contribuições para FUST e FUNTTEL. Apesar de a agência e as secretarias da Fazenda discordarem dessa interpretação, não é somente naquele estado que isso acontece.

Em abril, quando a Anatel anunciou que poria fim à Norma 4, entidades de classe e escritórios de advocacia que representam ISPs, dentre outros, manifestaram que a medida teria forte impacto no segmento, a partir da incidência do ICMS sobre as receitas das empresas, devendo até inviabilizar as atividades de muitas delas. Se as consequências podem chegar a tais proporções, é porque a classificação do serviço como SCI é corrente no mercado, apesar de um outro regulamento mais recente trazer outra determinação.

A Norma 4 foi criada numa época em que o acesso à Internet era discado e necessitava de um prestador de serviços de telecomunicações e de um provedor de conexão. Sequer a agência existia. A esta, como prevê a LGT, de 1997, cabe organizar a exploração dos serviços de telecomunicações, o que inclui disciplinar e fiscalizar a execução, comercialização e uso dos serviços e da implantação e funcionamento de redes, bem como da utilização dos recursos de órbita e espectro de radiofrequências.

Seguindo essas atribuições, a Anatel definiu, em sua Resolução 614/2013, que o SCM é o serviço fixo de telecomunicações “que possibilita a oferta de capacidade de transmissão, emissão e recepção de informações multimídia, permitindo inclusive o provimento de conexão à internet”. Este é o entendimento adotado tanto pela autarquia quanto pelas secretarias da Fazenda. Apesar disso, diversas decisões judiciais, como as observadas no Maranhão, fazem com que a Norma 4 prevaleça.

Em tese, caberia ao regulador dar a última palavra sobre o tema, o que se daria a partir da extinção do regulamento. Porém, como argumentam os que se opõem à iniciativa, a agência não tem competência para arbitrar sobre SVAs (incluído o SCI) ou mesmo revogar uma norma do Ministério das Comunicações. Nota-se que as indefinições trazidas pelo conflito regulatório podem ir além da categoria a que pertence o serviço de provimento de acesso à Internet: estenderiam-se, conforme alguns especialistas, a quem cabe regulá-lo.

Nesse cenário, surgem dúvidas quanto ao fim da Norma 4 em 2027. A própria Anatel poderia postergá-lo, como já fez, por exemplo, adiando a obrigatoriedade do uso da NFCom em mais de uma oportunidade. Paralelamente, há os que manifestam, como a Abrint, o desejo de recorrer à Justiça contra a medida.

Não se pretende aqui questionar os argumentos legais e regulatórios que sustentariam tais iniciativas. Mas, diferentemente do que alegam alguns, o fim da Norma 4 não traria insegurança jurídica ao mercado. Isso porque ela já existe e fica evidente quando há provedores que conseguem classificar sua principal oferta como SVA, enquanto que muitos de seus concorrentes ficam impedidos de fazê-lo.

Toda a discussão gira em torno dos tributos e contribuições incidentes sobre cada categoria de serviço, o que será pacificado pela Reforma Tributária. Esta prevê a substituição de ICMS e ISS (incidente sobre SVAs) pelo IBS. Ocorre que isso será feito gradativamente, entre o próximo ano e 2033. Até lá, caso a Norma 4 não seja extinta antes, empresas de porte semelhante continuarão arcando com cargas tributárias diferentes incidindo sobre um mesmo serviço, algo que inviabiliza a justa competição no segmento.

(*) Fabio Vianna Coelho é sócio da VianaTel, consultoria especializada na regularização de ISPs, e do RadiusNet, software de gestão para provedores de Internet.

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