Brasil pode perder corrida global da IoT sem prorrogação da racionalização tributária

O setor de Internet das Coisas pode ter sua expansão freada caso a atual política de racionalização tributária para os dispositivos de comunicação máquina a máquina (M2M) não seja prorrogada. Essa é a avaliação de especialistas, associações e lideranças do setor de tecnologia, que vêm intensificando o debate em torno da necessidade de uma racionalização tributária permanente para o IoT.

Instituída pela Lei nº 14.108/2020, a medida zerou taxas como TFI, TFF, CFRP e Condecine para dispositivos IoT, aliviando custos que antes inviabilizavam modelos de negócio baseados em milhões de sensores de baixo valor agregado. O efeito foi imediato: segundo estudo do Instituto de Pesquisa para a Economia Digital (IPE Digital), a política foi responsável por 43,75% do crescimento da demanda por IoT no país desde 2021, adicionando mais de 8,7 milhões de dispositivos ao mercado.

A mesma análise mostra que, sem a medida, o Brasil teria hoje quase 9 milhões de dispositivos a menos, e que a arrecadação agregada gerada pela expansão foi 3,3 vezes superior ao valor desonerado. O problema é que a validade da lei expira em dezembro de 2025, criando um cenário de incerteza regulatória para empresas que planejam investimentos de longo prazo.

Para o setor, a medida trata-se de um divisor de águas: com a prorrogação, o Brasil poderia alcançar 118,4 milhões de dispositivos IoT até 2030. Sem ela, o número cai para menos da metade, em torno de 40 a 60 milhões, segundo projeções.

Essa é a mensagem central do Manifesto ABINC pela racionalização tributária para o IoT, lançado pela Associação Brasileira de Internet das Coisas (ABINC), com participação de representantes do IPE Digital e da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee).

O documento apoia dois projetos de lei em tramitação no Congresso: PL 4.635/2024, de autoria do deputado Vitor Lippi, que propõe estender os incentivos até 2030 e o PL 214/2025, do deputado Davi Soares, que busca alterar definitivamente as bases legais para zerar a cobrança.

Roberval Tavares, Conselheiro Consultivo da ABINC e CEO da Constanta, destacou que a aprovação da lei de incentivo ao IoT é essencial para a competitividade da indústria brasileira. Ele ressaltou que o setor enfrenta complexidade tributária em níveis federal, estadual e municipal, mas a legislação é crucial para manter o crescimento do mercado, fomentar inovação, gerar patentes, empregos e arrecadação.

Segundo ele, o IoT não é apenas uma questão de manufatura, mas um projeto estratégico para o país, com impacto em setores como saneamento e pecuária, e deve ser tratado como prioridade em Brasília. “Essa lei não é só sobre impostos, é sobre o futuro do IoT no Brasil. Ela gera inovação, patentes, empregos e receita, além de fortalecer setores estratégicos. Aprovar e prorrogar essa medida é garantir competitividade e desenvolvimento para o país”.

Para Rogério Moreira, diretor de tecnologia da ABINC, a discussão precisa ser entendida sob a ótica de mercado, e não como renúncia fiscal. “Não é privilégio, é uma condição básica para que a IoT seja viável. Estamos falando de sensores baratos, que só funcionam em escala de milhões. Se cada dispositivo tiver uma carga tributária desproporcional, o modelo desmorona. É simples: sem desoneração não há escala; sem escala não há mercado; e sem mercado o Brasil perde competitividade. O risco é desperdiçar a confiança já conquistada com investidores e parceiros internacionais”.

O debate também reflete o papel horizontal da IoT em toda a economia. Agricultura de precisão, manutenção preditiva na indústria, telemedicina, cidades inteligentes, utilities e energia são áreas que já dependem da conectividade massiva de sensores. A volta da tributação, segundo os especialistas, inviabilizaria diversos projetos, do saneamento básico à logística, além de comprometer iniciativas de resiliência climática e monitoramento ambiental.

Agostinho Linhares, presidente-executivo do IPE Digital, reforça o caráter estratégico da política pública. “Estamos falando de competitividade nacional. Sem a prorrogação, o Brasil pode perder relevância tecnológica e comprometer sua agenda de sustentabilidade e transformação digital. A Lei 14.108 mostrou que é possível combinar racionalização tributária com aumento de arrecadação. Os dados indicam que a política ativou milhões de dispositivos, gerou empregos, aumentou produtividade e elevou a arrecadação. É um círculo virtuoso que não pode ser interrompido. O desafio agora é transformar essa medida temporária em uma estratégia de Estado”.

Enquanto o Brasil discute a continuidade de incentivos, países como Estados Unidos, Alemanha, Coreia do Sul e Japão avançam com políticas robustas de apoio à digitalização. Incentivos fiscais, crédito em P&D e integração com estratégias de inovação são práticas comuns nesses mercados. A Coreia, por exemplo, investirá US$ 7,2 bilhões até 2030 em IoT, enquanto a União Europeia harmoniza regras tributárias para reduzir custos de adoção. No comparativo global, o Brasil tem apenas 0,12 dispositivos IoT por habitante, contra 0,74 na Coreia do Sul e 0,35 nos Estados Unidos. O potencial de crescimento é gigantesco, mas depende da manutenção de políticas que estimulem a escala.

Wilson Cardoso, Diretor da Área de Telecomunicações da Abinee, destacou o impacto da política de exoneração fiscal para dispositivos IoT, que gerou R$ 2,57 bilhões em arrecadação adicional e aumentou a demanda em 43,75%, atingindo quase 9 milhões de dispositivos. Ele ressaltou que a IoT é essencial para manutenção preditiva e prescritiva, prevenindo perdas milionárias na indústria.

“Sem a IoT, indústrias correm o risco de perdas milionárias por paradas de produção. A manutenção preditiva não é luxo, é competitividade global. Precisamos de tempo, investimento e previsibilidade regulatória para implementar a transformação digital e manter o Brasil no ritmo da inovação mundial”, comenta.

Para Janilson Bezerra, líder do Comitê de Conectividade da ABINC, o tema vai além da regulação e envolve soberania tecnológica. “O IoT não é mais só P&D. Está no centro da transformação digital da indústria, agricultura e cidades. Conectar milhões de dispositivos não admite retrocesso. O que está em jogo não é só incentivo fiscal, mas a construção de um ecossistema nacional que gera empregos qualificados, estimula inovação e fortalece a soberania tecnológica do Brasil. A decisão do Congresso vai definir se seremos líderes regionais em IoT ou apenas espectadores da inovação”.

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