Falam por aí que o Marketing 6.0 é o santo graal da comunicação: IA generativa, big data, propósito inscrito em blockchain e personalização telepática. Na teoria, parece até jantar de gala em Veneza. Na prática, a orquestra desafina assim que a gente precisa alinhar agendas. E aí descobrimos que quem rege o trem é o RH, não o algoritmo.
Você já passou pelo vale dos 4 Ps, escalou a montanha dos 4 Cs, surfou na onda da experiência, mergulhou no propósito e ainda fez check-in no TikTok. Se sobreviveu a tudo isso, merece medalha de marketing de guerra. A promessa do 6.0 é simples: entregar a mensagem exata, para a pessoa exata, no momento exato, e ainda causar lágrimas de emoção, mas com selo “verde” e “diverso”.
Só esquecem de avisar que, para isso, é preciso tempo, orçamento e, espera um pouquinho… gente capacitada.
Chega a ser engraçado. O cliente quer campanha hipersegmentada, mas pede uma aprovação genérica até no mockup. Quer ESG, mas admite só se custar menos que o brinde de Dia dos Pais. E fala em IA, desde que um comitê de cinco departamentos fique acordando madrugada afora para checar cada palavra do texto gerado. Resultado? O marketing mais evoluído da história estaciona no modo “vamos marcar reunião”.
É como aquela dieta de fim de ano: todo mundo compra o livro de receitas detox, mas quando bate a fome, volta pro prensadão. O slide brilha, os gráficos hipnotizam, mas lá fora, a campanha emperra nos fluxos de aprovação. E, convenhamos, mexer em processo corporativo dá trabalho, reunião, post-it e café demais. Só faltam emojis nos e-mails.
O desafio é entender que o 6.0 é, antes de tudo, um projeto de gente. Customização sem autonomia vira enlatado. Dados sem storytelling soam robóticos. Propósito sem ação real cai na vala do “causewashing”. Se a marca não traduz compromisso em operação, o consumidor de hoje, que inclusive já sabe distinguir IA de gentileza, percebe o truque e segue em frente.
Mas nem tudo está perdido. Experiências pequenas, com times enxutos e autoridade para errar rápido, geram aprendizados reais. Onde processos engessados são drenos de criatividade, cérebros híbridos conectam insights a narrativas que fazem sentido. E, pasmem, até o RH pode virar protagonista quando entende que atrair e reter perfis “humanos-IA” é parte da estratégia.
No fim das contas, o Marketing 6.0 só decola quando internalizamos uma verdade óbvia: tecnologia empurra, mas quem pilota é gente.
E gente gosta de café, conversa, música, feedback franco e um pouco de caos organizado.
Até lá, seguimos atualizando termos do momento nos slides e operando no modo 2.3x, na expectativa de que a próxima versão já venha com decisor, jurídico e RH integrados num mesmo prompt.
Enquanto isso… seguimos humanos. Tentando.
*Por Vini Luiz, Diretor de Inovação da Orbital